segunda-feira, fevereiro 05, 2007

No RJ: Tráfico enfrenta milícias

5/2/2007 00:36:00

Rio - A guerra entre traficantes do Comando Vermelho (CV) e integrantes de milícias deixou seis mortos e dez feridos no fim de semana. Os confrontos na Favela do Barbante e Vila Juaniza, ambas na Ilha do Governador, e na Cidade Alta, em Cordovil, foram tentativas dos criminosos de recuperar pontos de onde haviam sido expulsos.

No primeiro ataque, sábado à noite, às duas comunidades da Ilha, quatro pessoas morreram e duas foram baleadas, mas os bandidos que haviam saído em dezembro não conseguiram retomar os locais. Já em Cordovil, traficantes retornaram ao conjunto habitacional um dia dia após invasão de milicianos, feita com ajuda de blindado da PM, de acordo com moradores.

Durante o confronto na Cidade Alta, foi morto o sargento Alex Sarmento Mendes, lotado na Diretoria Geral de Pessoal e suspeito de integrar o grupo armado. Seis pessoas ficaram feridas, entre elas menino de 11 anos. Poucas horas antes, quatro carros foram roubados na região, para formar o comboio que invadiu o conjunto. Nos assaltos, mulher foi baleada de raspão no joelho e bandido levou três tiros de fuzil nas costas.

Na hora da feira

Às 6h deste domingo, feirantes montavam suas barracas na rua principal da Cidade Alta, quando traficantes chegaram em diversos carros, atirando granadas. O sargento Alex foi baleado no olho. Logo depois, o sargento Antônio Souza dos Santos foi atingindo no braço e tórax. Ele está internado no Hospital da PM, no Estácio.

O menino Rafael Silva de Oliveira, 11 anos, ajudava a tia a montar a barraca e precisou se jogar debaixo de um caminhão para se proteger das explosões de granadas, mas foi atingido por estilhaços nas pernas. O feirante Lorisvaldo Gomes Brito, 25, foi socorrido por colegas numa Kombi após levar tiro de raspão na barriga.

Os outros feridos foram a aposentada Maria Osmarina de Mello Souza, 67 anos, baleada na perna; Emilson Ângelo de Oliveira, 31, atingido na barriga; e Rodrigo Alves Catureba, 18, ferido na mão esquerda. Segundo parentes de Rodrigo, o ajudante de caminhão voltava com amigos de baile funk na Chatuba, na Penha. Apenas Emilson e Rodrigo continuam internados no Hospital Getúlio Vargas. Depois do confronto, para conter tumultos, policiais do 16º BPM (Olaria) passaram o dia nas entradas do conjunto.

Show interrompido

A invasão da milícia ocorreu na madrugada de sábado e foi presenciada pelo cantor Elymar Santos, que fazia show na Cidade Alta. Por volta de 1h, o cantor foi obrigado a sair do palco. O som foi desligado e o clima ficou tenso na quadra do Bloco Barriga, onde havia cerca de mil pessoas. “Policiais foram ao camarim pedir desculpas e falar que a gente poderia continuar, porque era apenas uma operação de rotina. Cantei por mais duas horas”.

Segundo o cantor, os policiais estavam armados, mas não vestiam fardas. “No caminho até a Avenida Brasil havia vários policiais. Ouvi dizer que eles eram conhecidos da comunidade e que os moradores já sabiam que ia acontecer a operação”, contou Elymar.

Roubo de carros na véspera

Na noite anterior à retomada da Cidade Alta por traficantes, grupo de seis bandidos armados promoveu uma série de roubos de carros na Avenida Brasil, próximo ao Trevo das Margaridas, no Jardim América, onde houve falsa blitz. Policiais do Batalhão de Vias Especiais passavam na hora pelo local e trocaram tiros com bandidos. Fábio de Lima, 23 anos, foi preso enquanto fugia em um Pólo preto.

Fábio levou três três tiros nas costas e está no Hospital Getúlio Vargas sob custódia da polícia. Foram registrados quatro roubos de automóveis. Edvani Santos da Silva, 52 anos, viajava em ônibus da Viação 1001 próximo ao local e foi atingida no joelho esquerdo. A polícia informou se os ataques têm ligação com a invasão à favela.

Nos últimos meses, a Cidade Alta passou a abrigar traficantes do Comando Vermelho expulsos de favelas ocupadas por milícias, como Kelson’s e Quitungo, ambas na Penha. De lá também saíram, segundo investigações, os criminosos acusados de incendiar ônibus da Viação Itapemirim, em 28 de dezembro. No atentado, que seria retaliação à expansão das milícias, oito inocentes morreram carbonizados.

Mais um morto e três desaparecidos

O corpo da sexta vítima da guerra de milícias contra o tráfico foi encontrado no final da noite de domingo pelos próprios parentes. O corpo do motoboy Fábio Fernandes Rocha, 29 anos, foi queimado e deixado no porta-malas de um Peugeot, próximo à estação de trem de Cordovil. Ele foi reconhecido através de uma cicatriz na perna esquerda e da arcada dentária. No início da noite, a viúva do motoboy disse ter recebido telefonema anônimo informando da sua execução e onde encontrar o corpo. Os próprios parentes foram ao local e reconheceram a vítima.

De acordo com os parentes, Fábio teria sido mantido como refém pela milícia que ocupou a Cidade Alta, na madrugada de sábado, junto com outras três pessoas, que continuam desaparecidas. A família do motoboy havia registrado o caso na 38ª DP (Brás de Pina) como seqüestro e cárcere privado.

Segundo parentes, Fábio tomava cerveja em bar próximo de casa, quando foi espancado e algemado por milicianos. Ele teria sido levado para a quadra com mais três pessoas, onde ficou preso. No mesmo local, também estaria corpo de uma pessoa que os moradores desconfiam ser de traficante conhecido como Arilson.

A mulher do motoboy permaneceu desde sábado na casa da sogra com o filho de quatro meses. “Estou com medo de voltar lá. Não temos mais ninguém com quem contar”, disse ela, que preferiu não se identificar.

O delegado Gilberto Dias encaminhou a denúncia ao comandante do 16º BPM (Olaria), José Luiz Nepomuceno, que informou ter vistoriado a quadra, mas nada encontrou.

Moradores denunciaram ainda que a milícia determinou toque de recolher e bloqueou as principais ruas do conjunto com barricadas.

Fonte: O Dia